Quando vários indivíduos de uma única espécie são preservados em um lugar, um paleontólogo deve questionar se esse agrupamento é natural, ou seja, era um grupo familiar ou uma manada reunida, que poderia certo dia, ter sido mortos na sua trilha? A maioria dos acúmulos de ossos de uma única espécie não é tão interessante. Ao contrário, é composta de indivíduos não aparentados que, durante algum período desconhecido de tempo, morreram perto de um olho d’água ou foram levados por uma enchente. Se empacotássemos rapidamente os esqueletos remanescentes, a parte mais interessante da história – como todos aqueles dinossauros haviam morrido – estaria perdida para sempre. Pistas para a causa, as circunstâncias e o momento da morte não se fixam exclusivamente nos próprios ossos, mas também na posição dos esqueletos, na presença de marcas de dentes ou nos ossos estilhaçados e na característica do sedimento que se acumulou antes, durante e após a morte. A cena do crime, e não um achado digno de um troféu de paleontólogo, é como devemos encarar esse depósito fóssil.
Logo começamos a acreditar que esses animais encontraram o seu fim, ao mesmo tempo. Os esqueletos não estavam distribuídos aleatoriamente, todos os ossos pareciam apontar na mesma direção. Poderia ter sido o resultado de uma inundação ou um rio carregando vários conjuntos de ossos para o mesmo lugar, mas não conseguimos encontrar nenhuma evidência de que os ossos tivessem sido transportados dessa forma. Todos os esqueletos estavam intactos.
Além disso, as camadas finas de rochas vermelhas e azuis da face do penhasco implicavam que a área se compunha de lama de granulação fina e areia. Encontramos manchas nas gretas de lama infiltradas, sugerindo que a área passara por períodos de seca e de cheia. Pequenas carapaças achatadas de criaturas de água doce chamadas conchostráceos cobriam alguns esqueletos, os destroços de um lago em expansão. Perto dos esqueletos, a lama era quase pura, sem as tocas de vermes e as raízes de um solo que sustentasse a vida vegetal. Em geral, a rocha circundante dos esqueletos sugeria a maré enchente e vazante de um lago antigo.
Nunca se ouvira falar de uma coleção de fósseis semelhante a esta – era (e continua sendo até hoje) a única amostragem conhecida de uma espécie de dinossauro, à moda de Pompeia. Conforme a operação prosseguia nos depósitos, passamos muitas horas meditando sobre cenários da morte. Talvez esses dinossauros tenham morrido devido à proximidade de um vulcão ou sucumbiram a uma enchente rápida? “Talvez eles só tenham ficado presos na lama?”, Gabrielle Lyon, membro da equipe, sugeriu enquanto delineava com agulha de joalheiro os dígitos cerrados do pé de um dinossauro tombado. Para mim, a ideia de uma armadilha de lama parecia um pouco inverossímil. Embora escavadora experiente, Gabrielle era educadora, não uma paleontóloga ou geóloga. Animais modernos como as vacas, às vezes, morrem perto de olhos d’água – os animais grandes ficam atolados até as rótulas na lama e acabam morrendo de sede, exposição ao sol e fome. No entanto, é extremamente raro que manadas inteiras pereçam dessa forma.
Artigo completo: Scientific American Brasil
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